Coordenador do Projeto Noleedi integra equipe mundial que estuda os impactos da fragmentação de habitats

em 18 de dezembro de 2019

Estrada de acesso à Terra Indígena Kadiwéu. Estudo revela os impactos da fragmentação de habitats pelo mundo. Foto: Fernanda Prado

Artigo é destaque da Revista Science lançada este mês e resultado aponta que florestas tropicais requerem mais cuidados.


Animais que evoluíram em ambientes sujeitos a eventos de alteração de habitat em larga escala, como incêndios e tempestades, estão melhor equipados para lidar com a fragmentação florestal, causada pelo desenvolvimento humano, do que espécies em ambientes de baixa perturbação. Esta foi a principal constatação da pesquisa realizada em escala global comandada pela Universidade do Estado do Oregon – Estados Unidos.

Os resultados da pesquisa foram relatados na revista Science, uma das mais conceituadas da área cientifica.  Divulgada no dia 5 de dezembro de 2019 em um artigo intitulado “Extinction filters mediate the global effects of habitat fragmentation on animals” – Filtros de extinção mediam os efeitos globais da fragmentação de habitat em animais, na livre tradução – é um dos destaques da última edição.

Professor Danilo Bandini Ribeiro integra equipe de pesquisadores com banco de dados da Mata Atlântica. Foto: Fernanda Prado
“Fragmentação de habitat é quando, por exemplo, existe uma floresta intacta e ocorre a construção de uma estrada que corta essa floresta, aí ocorreu a fragmentação. Era uma área contínua e viraram duas áreas. Isso tem o efeito diferente em diversos animais e diversos organismos”, explica coordenador do Projeto Noleedi* o professor do Instituto de Biociências da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Danilo Bandini Ribeiro, um dos três brasileiros a participarem do estudo.

Ao todo, foram convidados a participar 33 pesquisadores e utilizados 73 bancos de dados de 35 habitats ao redor do mundo. Os conjuntos de dados continham 4.489 espécies de quatro principais táxons – artrópodes (2.682); aves (1.260); répteis e anfíbios (282); e mamíferos (265) – e os pesquisadores usaram software de modelagem para separar os efeitos da fragmentação de outros fatores.

Em 2006, Ribeiro concluiu seu mestrado que teve como tema a distribuição espacial e temporal das borboletas em ambientes fragmentados da Mata Atlântica. “Após meu mestrado, fui convidado a participar de um artigo sobre a temática da fragmentação aí os coordenadores dessa pesquisa mundial tiveram conhecimento e foram atrás dos donos dos bancos de dados. Assim surgiu o convite”, lembra o pesquisador.

“No meu caso, o banco de dados é da Mata Atlântica. Podemos dizer que é o habitat que primeiro sofreu grandes fragmentações no Brasil. São vários ciclos de fragmentação. Na colonização, a chegada dos portugueses foi pela Mata Atlântica. Depois veio o ciclo do café e o último grande ciclo foi a expansão da cana-de-açúcar. Nos últimos 60 anos que se tem a destruição da Mata Atlântica com a expansão das grandes culturas: pecuária, soja, cana-de-açúcar e ainda a ocupação do solo, uma vez que a Mata Atlântica abriga boa parte da população brasileira”, explica Ribeiro.
O estudo fala de fragmentação por ação humana, o trabalho inclui as perturbações naturais como terremotos, furacões, fogo, mas esses desastres naturais não geram a fragmentação e sim a degradação da área.

Estudo de Bandini é sobre a distribuição espacial e temporal das borboletas na Mata Atlântica. Foto: Paulo Robson de Souza

Florestas Tropicais requerem mais atenção
O resultado mais conclusivo do trabalho é que o efeito da fragmentação é mais intenso nas altas do que nas baixas latitudes. Perto da linha do Equador a fragmentação afeta muito mais as espécies do que próximo aos polos. Quanto mais afastada da linha do Equador, mais adaptadas são as espécies porque essas regiões são mais propensas a perturbações naturais: fogo, secas, tempestades, neve – pois tiveram que se adaptar a esses ambientes mais mutáveis enquanto as espécies dos trópicos têm um ambiente mais estável.

“A sensibilidade aumenta seis vezes em latitudes baixas versus altas. Isso significa que não apenas devemos nos preocupar com os trópicos, porque muitas espécies são encontradas lá que não existem em nenhum outro lugar da Terra, mas também são mais sensíveis à maneira como tratamos as florestas”, explica um dos autores do artigo, o professor da OSU College of Forestry e diretor da Forest Biodiversity Research, Matt Betts.

Como é um trabalho internacional, ele dá direções para ações em nível global. Segundo Ribeiro, uma das principais questões, em termos de políticas públicas, é o remanejamento de investimentos para a conservação das florestas tropicais. “A maior parte do recurso que a gente tem para conservação é para preservar áreas nos países mais ricos, onde o efeito da fragmentação é menor. O efeito da fragmentação é maior nos trópicos, onde há menos investimentos”.

*Projeto Noleedi
O professor Danilo Bandini Ribeiro é o coordenador do “Projeto Noleedi - efeito do fogo na biota do Pantanal sul-mato-grossense e sua interação com os diferentes regimes de inundação", onde as borboletas são um dos bioindicadores (indicadores biológicos da qualidade de um ambiente e de mudanças sofridas por ele ao longo do tempo, sejam elas antropogênicas ou naturais).

O projeto tem duração de 36 meses e teve seu início em janeiro de 2019. É uma iniciativa do Programa de Pós-graduação em Ecologia & Conservação (PPGEC) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Prevfogo/Ibama). Com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o projeto está pesquisando os efeitos do fogo na biota do Cerrado e Pantanal e suas interações com o regime de inundação na Terra Indígena Kadiwéu, que possui cerca de 540 mil hectares localizados no norte do município de Porto Murtinho, sudoeste de Mato Grosso do Sul. Noleedi, no idioma Kadiwéu significa fogo.

A pesquisa conta com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e parceria de diversas instituições: Semagro (Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar de Mato Grosso do Sul), Fertel (Fundação Estadual Jornalista Luiz Chagas de Rádio e TV Educativa de Mato Grosso do Sul), Funai (Fundação Nacional do Índio), Programa Corredor Azul/Wetlands International/Mupan (Mulheres em Ação no Pantanal), Terra Indígena Kadiwéu e Rede Aguapé de Educação Ambiental do Pantanal.

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