Há um ano com as atividades de campo paralisadas devido à pandemia do novo Coronavírus o Projeto Noleedi retorna agora, a partir da segunda quinzena do mês de abril de 2021, à Terra Indígena Kadiwéu. Diante da pandemia, o Projeto Noleedi – efeito do fogo na biota do Pantanal sul-mato-grossense e sua interação com os diferentes regimes de inundação, paralisou temporariamente parte de suas atividades. O objetivo foi evitar a transmissão da Covid-19 e respeitar as medidas preventivas adotadas desde o dia 17 de março de 2020 pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), que substituíram as aulas e as atividades presenciais por estudos dirigidos com uso de ferramentas de Educação a Distância (EaD) e Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs).
O
Projeto Noleedi tinha acabado de reestruturar o desenho amostral devido
aos incêndios de 2019 e estava no planejamento para o início das coletas dos
dados de fauna. Apesar da pausa dos trabalhos de campo, o projeto continuou
trabalhando remotamente, elaborando um mapa do histórico de fogo para uma
região maior do que a Terra Indígena Kadiwéu. Outros materiais também foram
produzidos e os alunos elaboraram a parte teórica dos seus projetos, fazendo
revisão bibliográfica.
O
Projeto Noleedi também suspendeu as visitas de monitoramento à Terra
Indígena Kadiwéu, local de aplicação do estudo, em concordância à Portaria Nº
419 da presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai). A portaria
estabeleceu medidas temporárias de prevenção à infecção e propagação do novo
Coronavírus. A situação de emergência pelo novo Coronavírus começou
oficialmente no Brasil no dia 6 de fevereiro, quando o presidente Jair
Bolsonaro assinou uma lei recomendando a adoção do isolamento ou da quarentena
como uma medida de segurança no território nacional. Quase um mês depois, no
dia 17 de março, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, assinou uma portaria
suspendendo as autorizações de ingresso em todas as Terras Indígenas do Brasil,
isso para evitar que as pessoas de fora das aldeias levassem o vírus para as
comunidades indígenas.
Além
de restringir a entrada de pesquisadores e civis de fora das aldeias, o contato
entre agentes da Funai ficou restrito ao essencial. Concessões para autorizações
de entrada nas Terras Indígenas foram dadas apenas para a prestação de serviços
primordiais às comunidades como de saúde, segurança, entrega de gêneros
alimentícios, medicamentos e combustíveis.
Na
Aldeia Alves de Barros, base de apoio ao Projeto Noleedi, foram adotadas
diversas medidas de prevenção como o isolamento, encerramento de todas as
atividades escolares, esportivas, reuniões, e proibição de entrada de qualquer
pessoa na comunidade. No local foi instalada uma guarita para permitir a entrada
de freteiros e de funcionários da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena)
com todos os cuidados: máscaras e uso de álcool em gel.
Atualmente,
segundo Gilberto Pires, membro do Primeiro Conselho da Liderança Indígena
Kadiwéu, a maioria dos moradores das aldeias com mais de 18 anos foi imunizada,
tomando a primeira e a segunda dose para “continuar a vida sonhando um dia
voltar ao normal”. Segundo Pires, a pandemia trouxe diversos impactos negativos
principalmente por causa do confinamento “porque muita gente trabalhava fora e
teve que retornar, foram dispensados do serviço, e tiveram que vir embora para
suas aldeias, enfim ficavam aqui sem condições de se manter. Esse foi o grande
impacto que tivemos, foi a falta de condições para sobreviver durante a
pandemia porque muita gente ficou desempregada.” Com a ausência das equipes de
pesquisadores do Projeto Noleedi em campo também houve impacto na
geração de renda pois guias e cozinheira deixaram de prestar serviços.
Protocolo
de biossegurança
Para
o retorno das atividades de campo o Projeto Noleedi criou um protocolo
de biossegurança e o submeteu às instâncias internas da UFMS como o Comitê de
Biossegurança do Instituto de Biociências e também o comitê da própria
universidade. O protocolo aprovado baseou-se no documento da própria UFMS e
também do Conselho Regional de Biologia. O projeto também submeteu o protocolo
à Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), para ver se havia alguma
medida adicional e foi sugerido que os pesquisadores, antes de viajarem para a
Terra Indígena Kadiwéu, precisariam fazer o teste de Covid-19 RT-PCR, mais
seguro para detectar o vírus. Os testes serão feitos através da universidade e
estando toda equipe negativada as viagens poderão acontecer.
Impactos
da pandemia
Segundo
Ribeiro, com a paralisação das atividades de campo alguns impactos negativos
ocorreram no projeto. Um deles foi o atraso nas pesquisas. “A gente tem muitos
alunos de pós-graduação envolvidos, então são projetos de mestrado e doutorado
que têm um tempo fixo para serem finalizados e esse atraso gera um problema
para as pessoas conseguirem terminar suas pesquisas no prazo. A maneira da
gente reaver esse prejuízo é retomando o projeto com o que for possível dado o
contexto da pandemia. A gente também vai tentar junto aos órgãos de fomento uma
extensão do projeto, para que ele possa ter pelo menos mais 12 meses para
finalizá-lo tendo em vista que ficamos um ano sem poder ir a campo. Nosso
projeto tem muitas atividades de campo, então atrapalhou bastante a gente.”
Mas
não foram apenas prejuízos causados pela pandemia no Projeto Noleedi.
Também neste período a iniciativa registrou resultados positivos. “Os principais resultados do projeto até o
momento são em relação à efetividade do Manejo Integrado do Fogo (MIF), a gente
está aí com o trabalho sendo finalizado. Em breve espero que ele seja aceito e
publicado para a podermos mostrar como o MIF é efetivo na diminuição dos
incêndios, além do outro aspecto, da elaboração de protocolos de coleta, de
criarmos uma metodologia para diminuir os impactos do fogo, o que demandou
bastante tempo, bastante discussão entre as pessoas e também a divulgação dessa
temática que é sempre muito pouco divulgada e quando é divulgada tem muitas
coisas erradas que são faladas a respeito do fogo, principalmente nos sistemas
dependentes dele como é o caso do Cerrado e do Pantanal. Então acho que o
projeto ajuda bastante a aumentar o entendimento das pessoas em geral sobre a
temática do fogo. Acho que esse também é um ponto que a gente alcançou com o
projeto, além da gente conseguir criar uma parceria muito boa com o povo
Kadiwéu. Estamos tentando expandir um pouco nossas relações tentando começar
algumas atividades voltadas à educação dentro das aldeias. Tudo isso são
resultados positivos do projeto.”
Além
disso, durante esse período de um ano a equipe de pesquisadores e parceiros do
Projeto Noleedi atuou ajudando a democratizar informações sobre os
incêndios no Pantanal participando em discussões, debates, palestras, artigos,
reportagens e iniciativas on-line no Brasil e no mundo. Veja a matéria completa
clicando aqui.
Sobre
o projeto
O
Projeto Noleedi teve seu início em janeiro de 2019. É uma iniciativa da
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e do Prevfogo-Ibama. Com
apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),
o projeto está pesquisando os efeitos do fogo na biota do Cerrado e Pantanal e
suas interações com o regime de inundação na Terra Indígena Kadiwéu, que possui
cerca de 540 mil hectares localizados no norte do município de Porto Murtinho,
sudoeste de Mato Grosso do Sul. Noleedi, no idioma Kadiwéu significa
fogo.
O
projeto pretende gerar dados sobre os efeitos do fogo ocorrendo em diferentes
épocas (precoce, modal e tardio) na biota da região, ou seja, no conjunto de
todos seres vivos de um determinado ambiente ou de um determinado período;
também vai verificar a interação dos diferentes padrões de inundação com os
efeitos do fogo sobre alguns grupos-chave da biota local.
O
Noleedi também vai criar de forma cooperativa e com o envolvimento de
agentes do Estado, populações tradicionais e pesquisadores um protocolo de
manejo do fogo e um protocolo de avaliação de impactos de incêndios na biota.
Ainda vai avaliar o manejo do fogo como uma estratégia de restauração passiva,
além de identificar traços que permitam selecionar espécies com potencial para
serem utilizadas na restauração de ecossistemas sujeitos ao fogo. Assim, deve
garantir recursos para a manutenção da fauna e o sucesso no recrutamento de
novos indivíduos. Também será conhecido o efeito do fogo sobre a reprodução de
espécies da flora utilizadas pela comunidade indígena.
O Projeto Noleedi conta com apoio do CNPq e parceria de diversas instituições, entre elas: Semagro (Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar de Mato Grosso do Sul), Fertel (Fundação Estadual Jornalista Luiz Chagas de Rádio e TV Educativa de Mato Grosso do Sul), Funai (Fundação Nacional do Índio), Programa Corredor Azul/Wetlands International/Mupan (Mulheres em Ação no Pantanal), Terra Indígena Kadiwéu Kadiwéu Kadiwéu e Rede Aguapé de Educação Ambiental do Pantanal.
O retorno do Projeto Noleedi às atividades em campo também virou tema do Podcast Informe Noleedi. Ouça na versão estendida ou compacta:
Podcast 17: Após um ano, Projeto Noleedi retoma atividades de campo – versão estendida – 14’31”
Podcast 17: Após um ano, Projeto Noleedi retoma atividades de campo – versão compacta – 11’25”
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